Sentada ali mirando aquela paisagem, eu pedia silenciosamente ao tempo: passe devagar, por favor…

Sentada ali mirando aquela paisagem, eu pedia silenciosamente ao tempo: por favor, passe devagar agora, por favor, por favor…

Todo um horizonte ali na frente, o vento soprando leve, não fazia calor, nem frio. O sol generosamente escondido atrás de nuvens cinza fazia o dia bucólico. As ondas quebravam majestosas na praia praticamente vazia e eu fitava aquilo com os olhos do meu coração. É diferente quando meu coração cria vida, braços, olhos e sente sozinho, independente de mim. É intenso, inexplicável.

Não estava relembrando o passado, projetando o futuro, tampouco supondo nada. Naquele momento eu me permiti apenas olhar para frente, para aquele momento e tudo o que eu soube fazer foi dizer a mim mesma: talvez a vida possa ser sempre assim.

Parecia um filme, parecia um sonho, parecia bom demais para ser verdade e meu coração abria ainda mais os braços para abraçar a mim mesma e me dizia serenamente: Ei mulher, abra os olhos, você não está sonhando. Permita-se viver.

Eu sorri por dentro muito mais do que sorri por fora, onde conservei um sorriso entre os lábios que revelavam minha clara incredulidade na felicidade gratuita que estava vivendo. Não era gratuita. Uma corrida de obstáculos se colocava a minha frente tentando me mostrar que não seria gratuita, que eu teria que enfrentar os meus próprios monstros, medos, fantasmas, meu túnel do terror interno se eu quisesse me permitir.

Acho que eu esperava acordar. Esperava com aquela estranha mania que todos nós temos de ficar na expectativa do sofrimento quando estamos felizes demais, como se não merecêssemos sermos apenas felizes. Esperava com aquela maldita previsão que minha vó, minha mãe faziam quando eu sorria demais e me diziam “quem muito ri acaba chorando” e eu acreditei tanto nisso que sempre penso quando as lágrimas virão, quando estou feliz demais.

Senti um cutucão do meu coração repetindo: “Ei mulher, abra os olhos, você não está sonhando. Permita-se viver. Por que é que nós não podemos ser felizes como sonhamos”?

Eu não sabia o que dizer para ele, que explicação lhe dar por fazê-lo sempre ter medo de ser feliz e ficar nessa eminência do sofrimento. Eu fingi que não sabia, mas eu sabia sim… Eu me importava mesmo com as outras pessoas, muito mais do que comigo mesma. E eu sentia culpa toda vez que estava feliz, se os outros não estivessem também. Mas as duas coisas nunca aconteciam ao mesmo tempo e eu sempre abdicava do meu direito de felicidade. Era isso o que eu tinha que assumir para meu coração, eu o privava da vida porque vivia a vida de todas as outras pessoas e o que elas esperavam de mim.

Mas eu estava ali naquele momento. Ali, somente ali, olhando para frente e repetindo para mim:aprenda a olhar para frente, aprenda a viver, permita-se viver A SUA VIDA.

O vento bagunçava o meu cabelo, o sol ressaltava as manchas na minha pele, meu coração com braços, pernas e olhos enraizou naquela cadeira enquanto olhávamos para o horizonte e ele sussurrava no meu ouvido: “fique quieta, não se mova, vamos apenas sentir”. E nós dois pedíamos ao tempo: “passe mais devagar agora, por favor, por favor, só um pouco mais devagar”.

Mas o tempo não nos atendeu. Ele nos olhou sem complacência e disse: “eu não posso esperar, se vocês querem viver a hora é agora. Eu não volto atrás, não dou segundas chances, eu tenho pressa”. E ele passou… Eu tive que levantar, ir embora…

Não acordei, porque não estava sonhando. Estava vivendo. Meus olhos permaneceram naquele horizonte. Meu coração ficou naquela paisagem e no braço que me envolveu dizendo: é assim que serão todos os dias da sua vida… se você quiser que seja assim.

Luciana Marques

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